Magehunter

Numeração original: 57

Publicação:
2 de Fevereiro de 1995

Autor:
Paul Mason

Ilustrações:
Russ Nicholson

Ilustração da Capa:  
Ian Miller

Tradução para o Português:  
Não editado no Brasil

Estranho em uma terra maligna
VOCÊ é um Caçador de Magos, rastreando malfeitores e levando-os à justiça. Sua fiel pistola de pederneira e sua bela espada de aço já passaram por muitas lutas, e você tem o conhecimento, a habilidade e o equipamento para capturar o feiticeiro mais astuto. Mas o desastre acontece. A magia arrasta você para longe do seu mundo familiar, para uma terra de tesouros, armadilhas e traições.

Histórias estranhas e transformações bizarras devem ser suportadas se você quiser vencer, derrotar seu inimigo e retornar à sua terra natal.

Review por: Thiago Macieira Rodrigues

Antes de iniciar esse review, é importante salientar que este é o livro mais difícil de se encontrar, pois ele só teve uma única impressão no Reino Unido, em 1995. Na internet, essa obra é um dos artigos mais caçados pelos colecionadores e os seus valores podem chegar a custar mais de R$ 3.500,00! E o mais incrível é que este livro é mediano em termos de jogabilidade e história, para não dizer medíocre em sua dificuldade. Portanto, se você tem esse livro, guarde em um cofre como se fosse uma barra de ouro. Dito isso, vamos às minhas observações.

No último e mais ambicioso livro de Paul Mason para a série de livros-jogos Fighting Fantasy o jogador interpreta um Caçador de Magos em um reino fantástico de nome desconhecido fora de Titan (não, não é Orb e nem Amarilla) e mais desenvolvido tecnologicamente, onde as armas de fogo de pederneira e pólvora, como as garruchas e os mosquetes do século XVII ou XVIII já despontam como alternativas viáveis para serem usadas em combate. O personagem do jogador, como Caçador de Magos, atua nas terras de um Margrave chamado Mechtner (uma espécie de governante feudal) e, nesse mundo alternativo, todos os magos são maus e representam uma ameaça à sua terra natal. Como um Caçador de Magos, é a sua tarefa usar de todas as técnicas e alternativas viáveis para eliminar da terra os poderosos feiticeiros que a ameaçam. Sobre o seu personagem, há um breve histórico traduzido nessa nota: “Sob o patrocínio do Margrave Mechtner, você se tornou o principal Magehunter de sua época. Orayan, o Invocador de Demônios, Yurial de Rachsburg, Salome, a Noiva do Feiticeiro – esses notórios feiticeiros, e muitos outros, caíram sobre você“. Nada sabemos sobre esse mundo inicial, exceto que os personagens têm nomes e títulos germânicos, armas de fogo de pederneita já são usadas e que você possui um florete como arma. Você está na caça de um poderoso e maléfico mago chamado Mencius e, finalmente, consegue capturá-lo utilizando uma armadilha de espelhos e uma corda de cabelo humano. Mencius é levado para a masmorra do castelo do Margrave, mas a má notícia vem quando você descobre que o Margrave está morto.

O pior ainda está por vir. Mencius é um mago que aprendeu a técnica de mudar de corpo com outra pessoa e, dessa forma, consegue enganar a todos ao trocar de corpo com o filho e herdeiro do Margrave, o jovem arrogante Reinhardt, que foi interrogar Mencius na masmorra. Ao tentar salvar o infeliz, Mencius abre um portal que suga todos que estão no recinto, levando você, o feiticeiro e Reinhardt para outro mundo. Transportado magicamente para Kallamehr, no sul de Allansia, você também nota que teve o seu corpo trocado com Mencius! O jogo, portanto, te obriga a salvar Reinhardt, trocar de corpo com Mencius, vencer o poderoso feiticeiro e conseguir retornar para a sua terra natal.


A premissa é interessante e inteligente, certamente fora do comum, mas a familiaridade do leitor com Allansia pode levar a alguns a torcer o nariz por desconhecer completamente o seu próprio personagem e o seu mundo original do qual nada sabemos. Também não há grandes reviravoltas ao longo do livro, que se resume em alcançar Kallamehr, buscar informações, localizar Mencius em sua torre Rangor (sim, a mesma torre da primeira aventura de O Saqueador de Charadas) e enfrenta-lo em um emocionante combate final. Outro ponto bem legal é que o foco da aventura está o tempo todo na relação entre você, o vilão Mencius e no seu companheiro Reinhardt, que você deve arrastar consigo. Os três estão com os corpos trocados e a interação entre os três ao encarar essa situação é muito divertida. Você está no corpo de Reinhardt e este está no corpo de Mencius, enquanto Mencius está com o seu corpo. Mais tarde, você pode trocar de corpo e permanecer como Mencius. A evolução do personagem Reinhardt também é digna de nota. A sua personalidade muda e se desenvolve bastante, iniciando como um garoto mimado e fraco para um líder corajoso e justo no final da campanha. Portanto, Mason se esforçou para desenvolver os personagens desta campanha e há um forte elemento narrativo no processo. 

Em relação à dificuldade, ninguém vai ficar surpreso que este livro é muito difícil, ainda mais se tratando de uma obra de Paul Mason. O caminho para vencer é muito estreito e está repleto de caminhos falsos. Contudo, existe uma lógica para encontrar o caminho verdadeiro. No início do livro, o autor lhe apresenta “O Mais Reverenciado Tratado de Caça aos magos”, que detalha os métodos mais elaborados para caçar um mago. Incluído neste livro está o Tratado Mais Reverenciado de Caça aos Magos, que resume o conhecimento sobre magos que você adquiriu ao longo dos anos. Entre outras coisas, revela que os bruxos podem ser contidos com uma corda de cabelo humano; eles não podem se proteger contra sua própria feitiçaria; eles não comem peixe; seus corpos incham até o dobro do tamanho se forem jogados na água; e que cada 101ª pegada deixada pelos bruxos é a de um gato. Isso pode ser razoavelmente sensato no mundo de onde você, o Caçador de Magos, vem, mas em Titan, torna-se quase inútil. Porém, considerando a sua situação, o Tratado, ainda assim, pode te ajudar, por exemplo, quando você precisa desenhar um símbolo sagrado na terra que pode apontar para o mago mais próximo, embora o método possa lhe apontar um outro mago diferente daquele que você está procurando. Isso é muito inteligente, embora sejam esses detalhes que podem levar o jogador a se perder e encontrar uma pista falsa que vai levar, inevitavelmente, ao fim do jogo. Paul Mason utiliza muitas palavras em código e itens-chave para monitorar o seu progresso, da mesma maneira que foi usado em The Crimson Tide. O jogo também deixa claro que você pode trocar de itens com seu companheiro e até mesmo trocar de corpo com ele quando o livro fornece a frase de efeito chave no qual você precisa estar atento.


O livro também é muitíssimo curto e isso se deve por causa da quantidade exagerada de caminhos falsos e variáveis que se propagam ao longo do livro, que se passa praticamente todo em Kallamehr. O caminho para a vitória quase não tem combates difíceis ou épicos. Creio que eu, em minha experiência pessoal, só tenha feito no máximo umas quatro ou cinco lutas até enfrentar o vilão. O único combate sério e bem escrito é o confronto final contra Mencius, na já mencionada Torre Rangor, abandonada desde a morte do barão Rangor em O Saqueador de Charadas. Gosto muito quando os autores procuram ligar os livros como se fosse uma sequência narrativa, ainda que eles sejam totalmente independentes. Não é necessário ter jogado Escravos do Abismo para ler Magehunter, mas sabemos claramente pela escrita que este livro se passa alguns anos depois dos eventos daquele livro e sempre considero como positivo essas referências intertextuais.

Este livro pode te punir bastante por explorar. Com muita frequência você vai morrer neste livro seja porque ficou sem opções, seja porque fez algo estúpido como atacar os guardas da cidade. Sim, a exploração de Kallameher é muito insatisfatória e não há nada de novo do que já não tenha visto em O Saqueador de Charadas ou Escravos do Abismo. Parece que este livro poderia ter sido um pouco maior, mas parece que, por razões de custo e tradição, os livros da Puffin dificilmente passavam de 400 referências. Como este livro se passa algum tempo depois dos acontecimentos de Escravos do Abismo, temos a menção de Lady Dunyazad, uma aristocrata importante presente naquele livro, e também do próprio Saqueador de Charadas que faz uma rápida aparição digna de um figurante sem importância para a história (e que nem está no caminho verdadeiro).

As batalhas não são difíceis e o livro até lhe ajuda a vencer alguns dos combates quando, por exemplo, você consegue uma maça sagrada que aumenta a sua Força de Ataque em 4. Porém, é um livro que exige uma SORTE altíssima para a difícil e injusta batalha final contra Mencius. Vale lembrar que Mencius está com o seu corpo e você com o dele. Mencius é um velho frágil fisicamente e você está no auge da sua saúde. Isso significa dizer que possuir estatísticas de HABILIDADE ou ENERGIA altas no início do jogo pode ser muito prejudicial e tornar a vitória impossível. Ainda nessa toada, os seus preparativos no início da campanha dão em nada quando você acaba trocando de corpo, inclusive você chega em Titan sem dinheiro algum. Isso também significa que suas estatísticas serão reduzidas no processo, proporcionando uma desvantagem artificial em encontros de combate. Apesar da dificuldade, pelo menos o livro passou por uma boa revisão e não há nenhuma falha ou a necessidade de perder uma rolagem de SORTE e HABILIDADE para chegar à vitória como nos livros de Jonathan Green.

Finalmente, após localizar Mencius e possuir as melhores armas para desafiá-lo, você o segue para a Torre Rangor. Após lutar contra um trio de esqueletos conjurados, o herói (no corpo de Mencius) avança para enfrentar Mencis (que está no seu corpo). A luta é extremamente injusta, uma vez que Mencius está usando o seu corpo, bem mais forte, e os seus poderes estão amplificados por causa da atmosfera mágica de Titan. Em cada série de ataque, ele ainda consegue lhe arrancar boas doses de ENERGIA mesmo que não tenha conseguido de ferir com rolagens de dados maiores. E, mesmo após a luta, haverá uma escolha decisiva que você vai precisar tomar se estiver atento aos detalhes. Apesar das dificuldades, esta certamente é a luta mais emocionante e mais bem executada de todo a aventura.

O livro contém uma gama incomumente ampla de variáveis ​​– se o personagem trocou de corpo, se ele está ciente de ter feito isso, se está com um companheiro, em quais corpos ele e seu companheiro estão, se o companheiro morreu ou se perdeu – que são rastreados na história por meio de um intrincado sistema de itens e palavras-código associadas a diferentes variáveis. O livro deve ter sido incrivelmente complicado de escrever para evitar descontinuidades. A área de Titan é predominantemente desértica, com cidades muradas e um toque distintamente árabe (Rocs, gênios, tapetes voadores, contadores de histórias, bandidos e comerciantes estão entre os encontros; os personagens têm nomes como Al-Bakbuk e Al-Haddar). Embora um tanto estereotipado, o retrato não é excessivamente hostil e inclui personagens árabes prestativos e simpáticos, bem como alguns hostis; principalmente, o livro joga com os estereótipos positivos de hospitalidade e generosidade.

O personagem do jogador, caçando Mencius ou procurando Reinhardt e possivelmente acompanhado por este último, pode encontrar e ter que lidar com um mago local, ou visitar uma bazar local para fazer compras ou obter informações, antes de finalmente chegar ao confronto final no coração de Kallamehr. A narrativa é bem inteligente, fazendo dessa obra um grande quebra-cabeça e a capacidade de atenção e observação do jogador (ou melhor, a sua sanidade!) são testadas ao máximo. Infelizmente, como o caminho certo é muito curto, você vai deixar de enfrentar criaturas bem legais como Elfos Negros, Mantícoras e Caranguejos-Gigantes. Existe mais de um final, mais todos os outros são blazés, bem insossos. Só o final do parágrafo 400 vale a pena.

As ilustrações de Russ Nicholson são competentes, e aqui temos imagens de gênios, de tapetes voadores, de sultões, de mercadores com vestimentas árabes bem largas, muita fumaça de incenso e torres abobadas. O cenário é perfeito para se usar como pano de fundo de algum conto da obra As Mil e Uma Noites. Foi o último trabalho de Nicholson em um livro-jogo, antes dele se dedicar para a série de livros-jogos Goldhawk, de Ian Livingstone. A capa é de Ian Miller, também em seu último trabalho, e temos aqui uma das piores capas da série, retratando uma águia salvando (ou alimentando) um dragão com um homem de turbante nas garras. Essa ilustração não detalha nenhum evento importante da aventura (se é que realmente existe o que está se passando na capa) e tanto a águia quanto o dragão estão pessimamente traçados, com contornos e detalhes estranhíssimos. A paleta de cores é uma aberração para os olhos e o título, juntamente com o selo do dragão de bronze apresentando os nomes dos criadores da série foram incluídas sobre as asas da pobre águia. O título, em um amarelo mostarda, torna-se quase ilegível diante dessa confusão.

Em suma, podemos concluir que Magehunter é um dos livros mais complicados da série, bem distorcido e que não dá muita margem de vitória por causa do seu caminho verdadeiro ser muito difícil de achar. Não é surpresa para ninguém quando uma aventura FF vem de um autor tão polêmico quanto Paul Mason. O livro tem pouca tolerância para com os erros e você ainda pode sair muito prejudicado se tiver um lançamento de HABILIDADE e ENERGIA altos. Há poucas pistas para se achar o caminho verdadeiro e os jogadores podem se frustrar muito por causa dos vários fracassos que terá. Em algum lugar, eu li que a probabilidade de ganhar isso aqui é de 8%. Apesar da premissa e do design inteligentes, um livro que desse mais chances de vitória ao jogador e tivesse mais combates épicos poderiam tornar essa obra bem melhor. Paul Mason se despede da série com uma aventura razoável, mas sem o mesmo brilho de suas obras anteriores. Ainda é melhor que Black Vein Prophecy, mas é muito pouco para uma despedida, ainda que digna.

NOTAS E CURIOSIDADES

  • A primeira página fornece algumas informações adicionais sobre o passado do herói: “Sob o patrocínio do Margrave Mechtner, você se tornou o principal Caçador de Magos de sua época. Orayan, o Invocador de Demônios, Yurial de Rachsburg, Salome, a Noiva do Feiticeiro – esses notórios feiticeiros, e muitos outros, caíram sobre você.”
  • “Sobre o assunto Magehunter … eu [Paul Mason] devo ressaltar que aprendi com meu erro com Crimson Tide e construí deliberadamente vários caminhos de vitória e diferentes níveis de vitória.” Carta de Paul Mason no registro do Internet Archive do antigo Fightingfantasy.com – recuperada em 26/10/2019
  • A “Folha de Aventura” apresenta incorretamente três caixas para HABILIDADE e nenhuma para ENERGIA ou SORTE.
  • As instruções dizem ao jogador para anotar as estatísticas de qualquer companheiro que possa adquirir durante a aventura, mas embora SORTE seja mencionada especificamente, não há lugar para esta estatística na “Folha de Aventura”.
  • Os locais, os eventos e muitos personagens (…e também os autores!) estão relacionados com os livros O Saqueador de Charadas Escravos do Abismo, ambos ambientados em Kallamehr.

Localização: Titan, Allansia.

Localidades: Kallamehr, no sul de Allansia.

Referências: 400

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